1ª edição da Oficina de Artes e Direitos Humanos | 02.05.2025

No desvelar do mês de maio, abrimos as portas da nossa sede para aquela que foi a primeira instalação da Oficina de Artes e Direitos Humanos do GRITAH. 

Esta iniciativa estava imbuída, desde o seu início, de uma simbologia distinta. Se olharmos para o ponto de partida, o edifício-sede onde habitou outrora a Escola Primária de Vilar, o X que traça no mapa o ponto do destino almejado indica a nossa futura Escola, a tomar lugar na Guiné – na escola que foi, ambicionamos a escola que virá a ser. Não fosse esta uma inabalável crença nossa: se é a Escola o meio onde se planeia um futuro melhor, também o percurso do GRITAH acaba por dar o exemplo e ilustrar esse mantra, ao estar, conscientemente ou por acaso, mas sempre tão intimamente entrelaçado com este seu propósito fundador: a Educação. 

Conceptualizamos uma Oficina de Artes com o intuito e a esperança de aliar a arte e os direitos humanos, num ato de criação em comunidade e num contexto de intervenção através da expressão artística. O que pretendemos foi despertar nos intervenientes o seu espírito de reflexão, como motor de divulgação da luta pela efetivação dos direitos humanos, da complexidade da nossa história e do impacto das decisões que moldam o mundo que herdamos. 

Com as intenções delineadas e o plano de fundo atribuído, reunimos amigos, familiares, amantes da natureza, poetas e artistas. Demos início ao dia de efeméride com uma caminhada conjunta ao Seixoso, numa travessia pela história e pelo território, escutando as memórias do lugar, colhendo plantas, pedras e inspirações. Trouxemos pelos caminhos cruzados com a vizinhança e a natureza a manifestação absoluta da alma do Tâmega e Sousa, o solo fecundo como representação física do legado que nos foi deixado. Nestas mesmas terras, que nos criaram e que herdamos hoje, de pensadores e personalidades ilustres das letras e das artes, encontramos mais conexões incontestáveis. É algo que não nos deixa indiferentes, como herdeiros dele e criados, educados, também nós, no mesmo seio – e urge-nos, em pleno século XXI, a levar a educação que tivemos a boa ventura de ter a quem não nasce e vive em igualdade de condições.

De volta à sede, exploramos saberes diversos através de diferentes oficinas e disciplinas artísticas. Acima de tudo, quisemos fomentar um espaço onde todos os membros da comunidade possam aprender e crescer, dar de si mas também receber, em igual ou maior medida. 

Através da música, contemplamos paisagens sónicas que providenciaram uma trilha sonora do dia, numa experimentação livre e pura do som como matéria viva. 

Nas paredes que contam já histórias de tempos idos dedicados à educação primária, pintou-se um mural coletivo, em celebração do sonho que nos liga cá, desde a Lixa, em Portugal, a Cumura, na Guiné-Bissau. Ilustramos o caminho e o encontro entre estas duas culturas, num intercâmbio fundado nos ideais de partilha, abertura e estabelecimento de pontes; um dia, edificado o centro escolar, cívico e cultural na Guiné, idealizamos espelhar lá um mural idêntico, unindo as duas escolas em comunhão. 

À boa maneira do GRITAH, e em espírito de dia de oficina, unimos esforços e valências na concretização de uma instalação artística itinerante, uma peça representativa das nossas causas, da herança humanista que nos move. Arte que viaja, que se desmonta e remonta para onde for chamada, como alerta para os tempos que vivemos.

Abordamos necessidades do espaço através de intervenções e restauros essenciais, vendo na preservação uma forma de criação. Com foco nas potencialidades e melhoramentos possíveis, quisemos promover um local de e para o coletivo, de essência comunitária, onde jovens com perspetiva de futuro podem sentir-se inspirados pela possibilidade sempre presente de crescer, de melhorar os espaços onde estamos inseridos, de deixar melhor do que encontramos e a noção singela de dar mais do que se tira. 

Cultivar um espaço comum passa por pintar, renovar, limpar e organizar, e este ciclo do plantar – regar – colher reside agora no nosso âmago, com a plantação de ervas aromáticas, plantas e flores colhidas pelo caminho e oferecidas pelos vizinhos, numa verdadeira conexão com a terra e com a região. 

Com as mãos e os pés na terra, trabalhamos o adobe, a matéria ancestral que nos liga à Guiné. Tijolo a tijolo, começamos a sonhar o forno comunitário que virá, num gesto simbólico de assentar da primeira pedra. É o abrir da porta para a comunidade, porque onde há pão há vida, e força para sonhar. 

No final do dia, é o próprio espaço que vibra com as mais-valias incutidas na sua própria orgânica; não é mais o mesmo local, não ficou indiferente nem imutável, mas sim mais rico, pois ganha uma história de vários e uma energia de renovação admirável que perdura. 

Fechamos a celebração à volta da fogueira, numa roda de fogo cujo calor não aqueceu tanto quanto a sopa partilhada e a gratidão tremenda que nos assoberbou. Foi o culminar dos esforços criativos, da liberação através do ato criativo, altruísta e meritório daqueles que, sem amarras, se entregaram de alma e corpo, da comunidade que nos é mais próxima. 

Entre histórias, poemas e testemunhos partilhados, todos nós alinhados e presentes num local onde a nossa voz pôde ser escutada, em pleno diálogo com o mundo, saímos relembrados de que se há causas bem maiores do que nós, então só o coletivo carrega em si a capacidade tão humana e abundante de se aproximar em amparo e ganho mútuo.

É esta a nossa missão: capazes e seguros, na forma que encontramos de fazer chegar às pessoas uma mensagem que acreditamos ser merecedora de todo o esforço. Consumada a primeira edição da Oficina, fica lançado o desafio, na convicção de que, haja terra fértil e alguma esperança para regar, haverá certamente alguma paz a florir, nesta primavera ou nas que estão ainda para vir. 

GRITAH (Beatriz Ferreira), maio de 2025